Marília Mendonça se foi e agora todo mundo vai sofrer

Publicado em 05/11/2021 20:56
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No ano de 2016, uma goiana cheia de histórias pra contar explodiu no Brasil. Seu primeiro grande hit “Infiel” (2016) colocava a mulher no papel de protagonista de sua própria história de uma maneira raramente vista no sertanejo nacional. Amante, traída, gordinha, empoderada, Marília convenceu nos mais diversos tipos femininos ao longo de sua tão breve e especial carreira. Compositora pra lá de criativa, Marília Mendonça usou seu violão como uma verdadeira arma contra a masculinidade tóxica em muitos dos seus hits. Seu peso acima da média, os cabelos loiros e os sucessos que traziam a amargura dum amor não correspondido, logo lhe deram a alcunha de “Adele tupiniquim”. Pode perguntar pra qualquer fã de sertanejo ou jornalista musical. Nunca houve uma “rainha da sofrência” como ela no Brasil. Alçada a condição de maior estrela sertaneja do país, Marília promoveu um dos eventos mais democráticos da história recente da música brasileira. Seu projeto Todos os Cantos percorreu as regiões continentais do país levando de forma sempre gratuita cultura e música de qualidade a quem quisesse ouvir ou não podia pagar. Como sustentar um evento nacional percorrendo várias capitais sem receber dinheiro por isto? Nem o astro sertanejo Luan Santana que tentou fazer um projeto do tipo conseguiu.

Uma das maiores canções do ano, “Troca de Calçada” subverte qualquer lógica patriarcal ao colocar uma prostituta envergonhada como protagonista. É o “Taca Pedra” na Geni de Marília Mendonça. A música sobre uma cafetina, aliás, segue entre as dez mais tocadas nas rádios do Brasil profundo. Chico Buarque e sua Geni ficariam pra lá de orgulhosos. Outro fato que chama atenção é que em 2018, Marília foi a única dos sertanejos a arriscar um #EleNão sobre a candidatura de Jair Bolsonaro ao governo federal. “Contra qualquer preconceito a favor do amor”, disparou a cantora sendo obrigada horas depois a apagar o vídeo, após ver seus familiares sofrerem ameaças por seu posicionamento. Já diante dum episódio de transfobia cometido em 2020, Marília pediu sinceras desculpas e deu espaço numa outra transmissão para que uma trans chamada Alice Felis pudesse contar uma violenta história sobre quando quase perdeu a vida. A verdade é que em tempos tão caretas, Marília foi a mais progressista dos sertanejos. A mais cabeça aberta num mundo cheio de bolhas. Gordinha, goiana, sertaneja, Marília quebrava suas bolhas. Quebrava as bolhas do Brasil profundo. Quebrava a lógica do sertanejo capiau sem informação ou instrução. Marília foi a atualização que o sertanejo precisava. Algo me leva a crer que vai demorar muito para o Brasil encontrar uma cantora e compositora como Marília. O Brasil vai continuar querendo Marília Mendonça por muito tempo. E sem alguém como ela, sinto pois infelizmente “todo mundo vai sofrer”.

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